Vinhas sempre num registo calmo,
apaixonado a "pisar-terreno", cheio de certezas que era aqui o teu
lugar. E eu deixava-te entrar, meio incrédula, meio a duvidar.
Ouvi demasiadas vezes "agora
é diferente". E percebi que quem repete muitas vezes essa frase é porque
guarda a incerteza e embrulha-a em mistério. Mas ela continua a existir.
E depois, depois tornavas-te
outra pessoa, cheia de indiferença, cheia de perplexidades e hesitações. Era o
teu outro lado a falar. A tua obscuridade. A tua parte mais sombria que poucos
acreditavam, menos ainda conheciam. Ficavas altivo, arrogante e achavas-te o
dono da razão.
Sem te dares conta (ou talvez até
desses) agilizavas as coisas de um modo tão egoista, que muitas vezes dei por
mim a perdoar-te por simplesmente seres assim. Quem "è assim" já tem
a sua dose envenenada de viver.
Trocavas as poesias por gritos,
as melodias por portas a fechar constantemente. Trocavas o amor por uma espécie
de veneno. Baralhavas isto tudo de tal maneira, que o Norte ficou o Sul, e o
Sul virou o Norte.
E eu perdoava-te. Porque te
amava, meio em segredo, meio em medo. (Que modo horrível de amar.)
Fazias-me sentir viva e era isso
que a que eu me agarrava sempre que tinha duvidas. Aguentei aquilo que diria às
minhas melhores amigas para jamais tolerarem, aguentei porque o amor sem peso
nem medida pode ser perigoso, pode virar jogo e pode calhar-te uma espiral labiríntica
que te faz zonzear os sonhos e a tua existência.
Mas depois, chega um dia, um dia
lindo, que olhas para ti mesma, que sorris, que recebes um empurrão dos bons,
dos teus amigos, de prémios pela tua carreira e o Sol volta a brilhar e tu
dizes simplesmente: BASTA.
Já não é o outro que importa, não
lhe desejas mal nenhum, precisas é de resgatar a tua paz e sentires-te viva de
um modo saudável e não doentio, de um modo positivo e não masoquista.
E quando esse dia chega descobres
novas forças em ti, sentes o formigueiro na barriga que todos os fins encerram
mas percebes que não há volta a dar, não há olhar para trás, não há "tanto
faz".Porque amor que é amor, não duvida, não entra e sai quando quer e lhe apetece. Isso é egoísmo.
Nita Domingos